Porto Alegre / RS(51) 99295-7297falecom@auralandell.com.br3ª, 4ª e 5ª - Com horário agendado.

Danos Ambientais

Post 55 of 69

O estouro ecológico da boiada

 

A teoria do aquecimento e do resfriamento terrestre ajuda-nos a refletir sobre a extinção de espécies animais, vegetais e o colapso de algumas civilizações. Na última fase de aquecimento, o mar avolumou-se, invadiu áreas enormes, moldando belíssimas e imaginárias esculturas nas rochas graníticas. À medida que o clima foi se transformando, houve, certamente, grande multiplicação de espécies, através de novas combinações genéticas e mutações.

É incontestável que qualquer atividade cotidiana se relaciona com o aumento da emissão de gases, porém, contra um determinismo cíclico, se for comprovado, não há remédio, mas existem paliativos, capazes de prorrogar os seus efeitos, ao adotar-se medidas que minimizem o aumento da espessura da camada de gases que envolve a Terra.

No Brasil, há uma crescente demanda interna e para exportação de produtos do agronegócio, e, dentre suas fontes geradoras de divisas, o que mais chama a atenção dos ambientalistas é a bovinocultura.

Motivados pelos benefícios financeiros, os pecuaristas brasileiros estão convertendo áreas nativas em pastagens, exigindo cada vez mais e mais hectares para atender a expansão dessa atividade. Essa expansão, infelizmente, está sendo feita à custa do desmatamento de áreas nativas, que gera grandes emissões de carbono contido na biomassa, pela queima, que responde, aproximadamente, por 70% das emissões brasileiras de gases do efeito estufa.

Para atender à demanda externa, a criação extensiva de gado não só vem provocando o desmatamento em nosso país, mas também, um maior consumo de água. Para cada quilo de carne são gastos 13.500 litros. Baseando-se que para o abate, o boi deve dispor de 300 quilos líquidos de carne, a quantidade de água utilizada para saciar sua sede, ativar o seu metabolismo e lavar sua carcaça no abatedouro, gira em torno de quatro milhões de litros, cerca de 4.000 mil reservatórios residenciais de 1.000 litros.

Mas o pior para a atmosfera, no entanto, é o que sai do organismo desses ruminantes. Pelo processo digestivo, eles expelem o gás metano (CH4) e, pela atividade microbiana de desnitrificação de seus dejetos, há liberação do óxido nitroso (NO2). Ambos têm um efeito potencial de 22 e 290 vezes, respectivamente, sobre o efeito poluente do CO2.

A queima do carvão para se fazer um belo churrasco, também aumenta a quantidade de gases que, diante de combinações com o hidrogênio presente na atmosfera, sob a forma de vapor de água, desce em forma de chuvas ácidas, danosas para a fauna e flora.

Não é conversa para boi dormir. Não é uma atitude alarmista, sensacionalista ou demagógica. Apenas mostra dados extremamente alarmantes, que merecem ser estudados, principalmente por pesquisadores brasileiros, já que o Brasil possui o maior rebanho bovino comercial do mundo, com quase 200 milhões de reses, um quinto do mundial. 

A alimentação humana, à base de proteína animal, cresceu consideravelmente nas últimas gerações, de maneira que, mudar os padrões de consumo, reduzindo a dieta carnívora, para minorar os custos ambientais, é uma questão complicada, mesmo com as alternativas disponíveis de grandes fontes de proteína vegetal. Fontes, aliás, que além de prestarem um grande benefício ao coração humano, ajudam a natureza.

Em 2050, teremos nove bilhões de bocas para alimentar e a demanda pela terra, água e comida vai continuar. Com todo este contingente humano estimado, presume-se que não haverá declínio do consumo de carne, mesmo com a queda registrada no oriente pelo mugir da vaca louca e aftótica, do cacarejar dos frangos gripados, do grunhir dos porcos pestilentos e do aumento ainda tímido do vegetarianismo.

Para que a indústria brasileira de carne deixe de ser um exorbitante negócio, na base do mercantilismo de castrar e engordar rebanhos, sem contabilizar os custos ambientais, resta a decisão do consumidor, já que a logística de produção é estabelecida pelas práticas racionais de aumento de produtividade e da rentabilidade do agronegócio, que, por sua vez, ligam-se à demanda. 

   

JOÃO O. SALVADOR é biólogo do Cena

(Centro de Energia Nuclear na Agricultura) – USP (Universidade de S.Paulo.

 

Publicado no Jornal de Piracicaba

16/11/07

Menu